26/02/2016

{Desafio de escrita} De algum lugar no mundo para... você

Foto: Flickr

26 de janeiro de 2007

Querido,

Sei que não lhe escrevo há muito tempo, mas é necessário desta vez. Serei breve, apenas uma história para te contar.

Começa comigo, arrastando o carrinho pelo corredor, as rodinhas rangendo sobre o carpete marrom. O quarto 22 acabara de ficar vago, e era para lá que eu ia. Uma belezinha de quarto, janelas amplas com vista para o pôr do sol entre os prédios altos. Cama com cobertas fofinhas e tevê de tela plana 42 polegadas. Mas, infelizmente, não estava lá para aproveitar do conforto, meu trabalho era, como você bem sabe, colocar tudo em ordem.

Então comecei. Troquei roupas de cama, varri o chão, aspirei e passei pano com um produto cheiroso. Limpei o banheiro e a pequena sacada privativa. O jardim lá em baixo parecia muito sombrio e pouco convidativo, mas o cheiro dos cedros ainda subia até o terceiro andar. Imagino se o casal que estava hospedado aqui gostava disso. Eu adoro.

Então abri o frigobar e algo chamou minha atenção de imediato. Uma caixinha de alumínio, como uma míni lata de sardinha, preta e bem feita. Tirei-a com cuidado e levantei a tampa com um estalido. Era um lindo anel de noivado. Sentei sobre meus pés enquanto encarava a joia. Um anel de noivado, pensei. No frigobar! Ou o homem ou a mulher devem ter esquecido de fazer a surpresa. Ou esperou que o companheiro descobrisse. Mas não ia simplesmente esquecer da surpresa. Um anel de noivado, oras! Deveria ser um momento especial. Porque estava ali?

Fiquei encarando o brilhante, que se parece muito com o que eu tenho. Não no dedo, mas o que fica pendurado na minha corrente, escondido sob o uniforme de camareira. Ganho há tanto tempo que parece que o tenho desde sempre. Um presente simbólico, foi o que ouvi de você quando o recebi, porque o presente maior estava por vir. Uma vida juntos. Eu guardei o anel com a promessa e também com um amor radiante no coração. Durante três semanas, fui a garota mais feliz da cidade, durante a sua estada . Mas então você se despediu e não voltou. Restou-me somente o anel, agora um lembrete cruel do que tinha sido para mim.

E agora outro anel estava em minhas mãos, meu querido. E você sequer pode imaginar quanta mágoa ele me trouxe: outra promessa vazia. Minha vontade era de atirar aquele anel longe, para afastá-lo de tudo o que ele remetia. Não é assim que funciona, você me diria, se estivesse aqui. Consegui ouvir sua voz, sabia? O Destino se encarregou dessa joia e não cabe a nós uma intervenção.

Mas foi o que você fez, querido. Mudou o seu destino quanto a mim, colocando-me no seu passado. E olhando para esse anel, eu compreendi. Naquele momento, naquele quarto de hotel, eu compreendi. O Destino era totalmente meu, e não poderia se encarregar daquele anel, e muito menos de mim. E no momento em que você me abandonou, abandonei a mim mesma, e a todas as minhas esperanças. Mas não mais. Mais tarde, quando a moça voltou para buscar a "caixa de sardinha especial" que o namorado esquecera, ela o encontrou na recepção de terno e gravata segurando uma única rosa amarela.

Eles escolheram seu destino, e agora eu o meu. Junto desta carta, está o símbolo de amor que você me deu. É seu novamente, para quem mais quiser iludir. Poderia lhe dizer para guardar para alguém especial, mas você o deu a mim e depois foi embora. Minhas palavras não serviriam de mais nada para você. Já aconteceu, e agora transformo meu lembrete sólido em passado. Adeus, meu não-mais-querido. Até nunca mais. E o que o Destino...

Bem. Ele com certeza irá se encarregar de você.

Com os votos mais sinceros que pude arranjar, 
Catarina



Esse texto faz parte do Desafio de escrita, e corresponde ao primeiro item: sozinho(a) em um quarto de hotel. Espero que tenham gostado... Mais em breve! =^.^= 

Nenhum comentário:

Postar um comentário